Saturday, January 29, 2022

esperando você

 

Escrevi uma mensagem no guardanapo de papel. Marquei um encontro secreto, só nós dois, à meia noite na beira do mar. Esperei até as duas da manhã e você não apareceu. 30 anos se passaram desde então. Esqueci, mudei, vivo a vida. Às vezes, de noite deitado no meu travesseiro, acredito ouvir o barulhinho das ondas subindo e descendo a areia. Percebo que não esqueci. Estou sentado na beira do mar até hoje, esperando por você.

Monday, January 17, 2022

viver é sobreviver momentos

 Viver é sobreviver momentos, para descansar por outros momentos e sobreviver momentos de novo. Como um caldo na água gelada, uma correnteza que puxa para baixo e nos deixa subir de vez em quando para respirar. A maioria dessas respiradas é ligeira, tempo o suficiente apenas para escapar de sufocar-se de vez. Às vezes, porém, as respiradas são prolongadas, e podemos enxergar a beleza do viver: o pássaro na janela, o senhor na bicicleta antiga, o carteiro entregando novidades, o cheiro de pipoca doce, a nuvem tentando alcançar o céu. Durante uma curta respirada vi uma estrela e lembrei que o infinito existe. Quando submergi de novo, levei o infinito comigo, e ele se tornou maior ainda, dentro do meu coração.

Saturday, January 01, 2022

o seu amor será o mundo

Eu quero te pedir felicidade: não pra mim, a felicidade que eu desejo é para você. Quero que você me faça o favor de ser feliz. Quando tudo parece impossível, deposite em você a sua confiança. A felicidade que eu te peço é a coragem de ser você, mesmo que a vida te maltrate. Seja rebelde, seja você. Ame-se antes de amar o mundo e o seu amor será o mundo.

Sunday, December 26, 2021

derradeira felicidade

 Lembrou de ser feliz à noite, depois de um dia de angústias. Fechou os olhos e viu a pessoa que um dia significou alguma coisa. Teve saudade, não da pessoa, mas do significado. Daquele valor no coração, que fazia passar por qualquer tempestade. O tempo cria neblinas, percebeu, nuvens pesadas cinzentas, que apagam sonhos e criam realidades geladas. A felicidade, que um dia foi parceira constante, passa a ser um encontro ocasional, um devaneio noturno. Um dia, pensou, quero ser jovem de novo, para perder o primeiro amor e chorar por longas madrugadas, na ignorante certeza de que aquilo é tristeza, quando ao certo é derradeira felicidade.

Monday, March 04, 2019

o peixinho


Ela sempre implicou com o carnaval. Não que condenasse a manifestação da alegria. Pelo contrário, via na dança, na música e na festa um direito incontestável da alma. A implicância dela era com a hora marcada: felicidade não tem data. Não concordava que um país inteiro parasse tudo para ser feliz e dias depois retornasse para uma rotina de muitos problemas. Felicidade é algo espontâneo, ela acreditava. É o peixinho pulando na beira da praia ao raiar do sol. É o casal que se beija ao ver uma estrela cadente.

Thursday, January 24, 2019

infinito coração


Eu acredito no sol e na lua. Acredito nas folhas de outono quando cobrem o chão. Acredito nas tempestades que sacodem janelas e nas chuvas de verão. Acredito no canto do galo de madrugada e na cigarra que anuncia o tempo bom. Eu acredito na verdade de um sorriso, acredito na vida, acredito na solução. Grande grande é o homem, gigante a mulher, infinito é o coração.

Monday, November 26, 2018

carrossel


Aconteceu numa daquelas feirinhas do interior do Brasil, com barraquinha de beijo, de pipoca, maçã do amor, tiro ao alvo, chão de terra batida, adultos falastrões, crianças espoletas, música e carrossel. Luzes coloridas preenchiam o azulado chumbo do anoitecer. Um jovem casal se encontrou em frente ao carrinho de algodão-doce. Cumprimentaram-se com dois beijos tímidos no rosto e caminharam lado a lado pela feirinha. Era o primeiro encontro e ferviam por dentro de insegurança. Lá pelas tantas ela disse que nunca andara de carrossel. Juntaram as moedas que traziam nos bolsos e compraram duas entradas. Sentaram-se numa pequena carruagem em forma de abóbora, cercados por crianças em cavalinhos, renas e unicórnios. Assim que o carrossel iniciou os giros, as luzes se tornaram rabiscos coloridos, a música diminuiu o ritmo, e o casal viajou a um universo à parte. As pontas de seus dedos se tocaram, beijaram-se. Quando, dois minutos adiante, o carrossel parou, as crianças nos cavalinhos se queixaram, decepcionadas, de que o passeio fora rápido demais. O jovem casal se afastou, agora de mãos dadas, sem norte definido. Para eles o carrossel continuava a girar na eternidade do primeiro amor.