Saturday, July 19, 2014

a estranha moda das doações em festas infantis

a tradição de presentear o aniversariante originou-se nos ritos religiosos: da mesma maneira que se acendia velas nos templos e se fazia oferendas aos deuses, presentear o aniversariante (e acender velas no dia do aniversário) era um gesto de desejar boa sorte e pedir proteção para o ano que se iniciava. aos poucos, a tradição religiosa transformou-se num ato de carinho com o aniversariante. finalmente, virou obrigação – ir num aniversário sem presente é falta de educação. essa obrigação transformou o antigo rito num festival capitalista. hoje, quando vamos num aniversário de criança, é preciso passar antes numa loja de brinquedos. o resultado é, na regra, um monte de presentes de plástico que são deixados de lado pela criança aniversariante após poucos dias.

algumas mães, cientes desse consumo que perdeu o  sentido e ecologicamente incorreto, resolveram mudar o rito: pedem que os convidados façam doações a uma instituição que cuida de crianças carentes. a iniciativa é em si muito nobre, mas distorce tanto a origem do presente como o gesto carinhoso que o presente representa. pelo ponto de vista da origem, deixamos de desejar sorte ao aniversariante; pelo ponto de vista do carinho, ficamos impedidos de dar algo pessoal para o filho dum amigo numa data especial.

sou 100% a favor de filantropia e penso que, num país desigual como o Brasil, temos todos o dever moral de contribuir de alguma forma (seja com dinheiro, com ajuda braçal, com doação de roupas ou até mesmo com aconselhamentos) para ajudar pessoas carentes ou ignorantes, mas penso também que é preciso tomar cuidado, para não distorcer o sentido dos gestos. quem quer fazer filantropia, faz por livre vontade, não porque os pais dum aniversariante pediram. e quem quer dar um presente para o filho dum amigo, tem o direito de dar o presente.

quero deixar claro, porém, que entendo a iniciativa; também sempre me questiono sobre o sentido de meu filho receber um monte de brinquedos impessoais de plástico, mas, por outro lado, é inegável que sempre há um o outro presente pessoal no meio, escolhido com muito carinho. não tenho, portanto uma conclusão definitiva. apenas uma reflexão.

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